sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Última chamada

O celular tocou de dentro da bolsa de Mariana, e ela resolveu não atender. Não queria atrapalhar a aula. Nem poderia, a julgar pela expressão de Caxias do professor. Verificou para ver quem ligava. Era seu marido. Jogou de volta o celular na bolsa, que continuou a vibrar constantemente, uma, duas, três, vezes... até cessar de vez.

Foi só após descer as escadas, que levam ao estacionamento da faculdade, que Mariana lembrou-se de retornar a ligação. Não obteve resposta. Insistiu. Nada. Tentou mais algumas vezes. Por fim, cansou-se. Estranho, pensou, parecia ser urgente. No caminho de casa, pensou que poderia ser uma boa parar em algum posto de gasolina para abastecer o carro, aproveitando para ligar para seu marido. Ligou seguidas vezes, até largar o celular no banco de passageiro, desistindo terminantemente de ligar. Apressou-se.

O carro parou em frente à garagem da casa. Já um tanto aflita, Mariana caminhou-se ao portão, remexendo a bolsa procurando as chaves. Abriu, e afastou o portão para o lado. Ouviu um barulho vindo de dentro. Ficou mais calma. Bom, pelo menos ele está em casa, concluiu Mariana. Depois de colocar o carro na garagem e de trancá-la à chave, andou até a porta da frente. A dos fundos, que fica na garagem, estava trancada por dentro. Após entrar, Mariana estarreceu-se: seu marido estava inerte no chão. Correu em direção ao corpo bastante trêmula. Ajoelhou-se chorando, gritando por socorro. Olhou assustada para o celular na mão dele: a última ligação discada era para ela, e desfaleceu...

Fincou os brancos pés nas areias gélidas dos ventos de setembro. Observava defronte ao mar as aves que migravam para outras areias. Mariana ainda conservava firme o celular nas mãos. Nunca mais o largou a partir de então. Ainda queria ouvi-lo uma última vez. Esclarecer sobre aquela noite. Talvez uma despedida. Viveu o restante da sua vida esperando por aquela voz.    

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