sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Seis sacos cheios

Claudomiro acordou para mais um dia de trabalho. Um pouco atordoado, ergueu-se a muito custo da cama. Conseguiu ao menos sentar-se. Pondo a cabeça por entre mãos, tentou lembrar-se do que aconteceu ontem. Percebeu que suas mãos doíam. Tinha as unhas sujas por uma lama avermelhada. Suas costas também doíam bastante. Enquanto olha para o chão enegrecido da casinha onde mora, as lembranças viam surgindo meio confusas. Em algum momento ele lembra de que fora despedido do emprego. Sentiu-se aliviado por não precisar ir trabalhar nesse dia, pois a cabeça dava voltas e o corpo pedia descanso. Deixou-se cair na cama, quase adormecendo novamente. A tênue nuvem da lembrança vai ficando cada vez mais espessa. Uma crescente palpitação assomou-lhe o peito. Arregalou os olhos de espanto.

 

Foi pela tardinha, quase ao cair do sol, que o patrão mandou chamar Claudomiro. O patrão disse-lhe, sem explicações, que não precisaria mais dos seus serviços. Apesar da surpresa da notícia, manteve-se impassível. Não passava pela sua cabeça ficar trabalhando por muito tempo naquele serviço pesado de roçado, seis sacos cheios, cada qual pesando mais ou menos vinte quilos, todos os dias da semana, menos aos domingos, da missa. Aquilo não era coisa que um quase velho, de quarenta e oito anos, possa suportar, sem receber em troca, as costas e os ossos das pernas moídos, ao final de uma semana. De repente lembrou-se das dificuldades pelo qual passaria a partir daí, sem emprego, sem oportunidades, dificuldades de uma idade avançada. Será com certeza muito difícil, pensou. Foi algo de errado que fiz? perguntou Claudiomiro, ao patrão. Não..., respondeu o patrão. Somente não preciso mais do seu trabalho... a safra diminuindo ano após ano... não tenho mais condição de pagar-lhe. Claudiomiro virou-se para o mundo de terras a sua frente. Tantos anos... pensou, e saiu andando ainda sem saber o que fazer. Pensou em sua companheira, gostava muito dela, mas ultimamente as coisas não iam bem. Resolveu procurá-la, para se acertarem...

 

 Ao chegar à casa da mulher sentiu um arrepio no corpo. Ela sentada em que estava, de costas para a porta, não ouviu quando ele entrou. Com o patrão de Claudomiro, a mulher marcou uma conversa para logo em seguida. Ele então resolveu ir também. A sua companheira e seu patrão encontraram-se no antigo mercado da cidade, numa ruazinha que descia até a praia. Abraçaram-se e se beijaram. Foi quando Claudimiro saiu de onde estava aproximando rapidamente do casal, efetuando dois disparos. A mulher caiu, mas o patrão resistiu-lhe, entrando atracando-se por algum tempo. Outro disparo. Claudiomiro fugiu tropeçando na penumbra da rua.

 

Eram três da tarde do outro dia quando se ouviu uma batida forte na porta do casebre. Claudomiro levantou-se exausto para atender a porta. Três homens invadiram a sala e o agarraram batendo no pobre desgraçado até cair; no chão, contorcia-se de dor. Levaram-no preso. E quando ia escoltado finalmente lembrou-se do que havia lhe acontecido. Seguiu adiante com os guardas. Não passava pela sua cabeça aquela vida pesada no campo. Pensava em tentar uma vida melhor.    


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